
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, advertiu, ontem, o Hamas para as severas consequências se o ciclo de libertação de reféns for interrompido. “Se o Hamas não libertar nossos reféns até o meio-dia de sábado, o cessar-fogo terminará e (o Exército israelense) retomará os intensos combates até que o Hamas seja derrotado definitivamente”, alertou o premiê, em um comunicado. Em Washington, ao receber o rei Abdullah II da Jordânia, na Casa Branca, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, renovou as ameaças ao grupo radical e insistiu que assumirá o controle da Faixa de Gaza.
Trump já havia ameaçado, na véspera, provocar um “inferno” em Gaza se os reféns israelenses não forem soltos, como estabelece a trégua em vigor desde 19 de janeiro. “Pessoalmente, não acredito que vão cumprir o prazo”, afirmou o presidente dos EUA, acrescentando: “Acho que querem fazer pose de durões, mas veremos se realmente são durões.”
O armistício interrompeu mais de 15 meses de conflito em Gaza e permitiu cinco trocas de reféns, capturados pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, por prisioneiros palestinos detidos em Israel.
Em resposta às declarações de Netanyahu e Trump, o Hamas cobrou respeito ao pacto firmado com Israel, que, segundo o grupo radical, não está sendo observado. “Trump deve lembrar que há um acordo que ambas as partes devem respeitar, e que essa é a única forma de fazer com que os prisioneiros retornem”, declarou Sami Abu Zuhri, um dos líderes do Hamas. “A linguagem das ameaças não tem nenhum valor e complica ainda mais as coisas”, frisou.
Com a trégua por um fio, o líder dos rebeldes huthis do Iêmen disse que retomará os ataques contra Israel em caso de uma escalada do conflito na Faixa de Gaza. “Estamos prontos para intervir militarmente a qualquer momento”, declarou Abdel Malek al Huthi em um discurso transmitido pela emissora de televisão Al Masirah, afiliada ao grupo.
O tom agressivo das declarações deixou a comunidade internacional em estado de vigilância. O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, pediu a libertação dos reféns e que se evite “a todo custo que as hostilidades sejam retomadas em Gaza”. Netanyahu não disse quantos reféns devem ser entregues.
Desde o anúncio do adiamento da libertação de cativos, na segunda-feira, Israel deixou as tropas em alerta, preparadas “para qualquer cenário”. No mesmo dia, o exército reforçou a presença militar na área do entorno do enclave palestino.
Ontem, familiares dos reféns se reuniram em frente ao gabinete de Netanyahu, em Jerusalém, com bandeiras israelenses e fotos de seus entes queridos. “Não podemos permitir outro impasse entre as partes. Há um acordo. Cumpram-no!”, disse Zahiro, cujo tio, Avraham Munder, morreu em cativeiro.
Em Gaza, Adnan Qasem, 60 anos, disse que estava rezando para que o cessar-fogo se mantivesse. “Não há garantias porque a facção governante em Israel quer guerra, e acho que também há uma facção dentro do Hamas que quer guerra”, disse ele, em Deir el Balah, no centro do território.
O acordo de cessar-fogo também foi abalado pela proposta de Trump de assumir o controle do território palestino e realocar seus mais de 2 milhões de habitantes para países da região, principalmente Egito e Jordânia. O presidente egípcio, Abdel Fatah al Sisi, pediu a reconstrução de Gaza “sem deslocar os palestinos”, depois que Trump ameaçou interromper a ajuda militar caso se recuse a receber os habitantes do enclave.
Sob pressão, o rei Abdullah II da Jordânia se reuniu com o assessor de segurança nacional dos Estados Unidos, Mike Waltz, e com Trump, na Casa Branca, e disse que seu país está disposto a acolher cerca de 2 mil crianças com câncer de Gaza. “Acredito que é uma das coisas que podemos fazer. Isso é possível”, disse o monarca, que estava acompanhado do filho, o príncipe Hussein. Trump classificou a iniciativa como um “gesto bonito”.
Após o encontro, o monarca, em postagem nas redes sociais, reafirmou sua oposição à ida em massa de palestinos para seu país. “Ressaltei que meu compromisso principal é com a Jordânia, com a sua estabilidade e com o bem-estar dos jordanianos”, publicou.
O rei acrescentou que o Egito apresentará um plano sobre como os países da região poderiam “trabalhar” com Trump, apesar de as nações árabes e os palestinos terem rejeitado categoricamente a proposta do magnata. O assunto será debatido numa cúpula em Riade, capital da Arábia Saudita. “A questão é: como fazemos isso funcionar de uma maneira que seja boa para todos?”, questionou Abdullah.
Em três semanas de vigência, a trégua permitiu a libertação de 21 reféns, dos quais 16 israelenses, em troca de mais de 700 prisioneiros palestinos detidos em Israel. Pelo acordo, um total de 33 reféns israelenses devem ser soltos na primeira fase do armistício, que termina em 1º de março. O Exército israelense e o kibutz Kissufim anunciaram, ontem, a morte, em Gaza, do refém Shlomo Mansour, 86 anos.
A segunda fase, cujas negociações deveriam ter sido iniciadas esta semana, deveria resultar na libertação de todos os cativos e no fim definitivo da guerra, antes de uma etapa final dedicada à reconstrução de Gaza.
A recuperação e a reconstrução da Faixa de Gaza, devastada após 15 meses de guerra, vai demandar um investimento de mais de US$ 53 bilhões (R$ 306 bilhões), sendo mais de US$ 20 bilhões (R$ 115 bilhões) nos três primeiros anos, segundo estimativa da ONU publicada ontem. “Embora no contexto atual não seja possível avaliar plenamente a lista completa de necessidades que serão requeridas na Faixa de Gaza, essa avaliação parcial dá uma amostra inicial da escala considerável das necessidades no território”, assinala o secretário-geral da ONU, António Guterres, em um informe elaborado a pedido da Assembleia Geral. Estima-se que os combates e bombardeios israelenses em Gaza tenham gerado “mais de 50 milhões de toneladas de escombros, sob os quais jazem restos humanos junto a munições sem explodir, amianto e outros elementos perigosos”.
Deixe um comentário